27/01/2015, por Atheniense Advogados

A transição que não houve

Por Aristoteles Atheniense

A desagregação das comunidades foi censurada por Platão na “República”, por ser a origem dos regimes oligárquicos. A avidez das classes dirigentes constitui o perfil imoral das cidades, concorrendo para a sua devassidão, ainda que encoberta com a distribuição de honrarias públicas, destinadas a assegurar a manutenção do poder. 

Segundo o filósofo, trata-se de um regime que abomina toda a espécie de limites, voltado para acumulação da riqueza, que fomenta o desrespeito, que repudia a autoridade, permitindo que cada um viva a seu bel-prazer, com total indiferentismo aos interesses maiores da sociedade.

A ambição tornou-se um ícone cultural do nosso tempo, concorrendo para a idolatria da riqueza, enquanto que o dinheiro não serve para ajudar o próximo, mas apenas para produzir mais dinheiro.

No filme “The Wolf of Wall Street”, que retrata a ascensão de um especulador na Bolsa de Nova Iorque, interpretado por Leonardo DiCaprio, a primeira recomendação feita a quem pretende se enriquecer foi a de que “a regra número 1 consiste em passar o dinheiro do bolso do cliente para o seu”.

No Brasil de hoje, forçoso é admitir que estamos caminhando não somente para uma corrupção acentuada, mas, igualmente, para a submissão às leis corruptas, em lugar de uma legislação repressiva que impeça as atividades fraudulentas.

“Como voltar a ter esperança no futuro?” Indagou em voz firme o Papa Francisco aos membros do Parlamento europeu em Estrasburgo, na França.

Não deve ser outro o questionamento que cada brasileiro deva fazer numa fase – não de transição – mas de continuidade do poder, assegurada pela condescendência com o malefício e aviltamento das regras elementares que deveriam reger a atuação do Estado.

Tudo faz crer que se trata de uma doença progressiva e incurável, que teve no escândalo da Petrobras a melhor demonstração da cupidez que medrava naquela estatal.

Não bastasse a humilhação que lhe foi imposta de não conseguir sequer fechar o seu balanço do terceiro semestre de 2014, surgem agora notícias de outros descalabros que comprovam o comprometimento do governo em áreas onde jamais poderíamos imaginar que fossem praticadas.

A maré crescente dos protestos, que tende a tornar-se ainda maior, provoca o refluxo da desilusão, isto é: na medida em que a corrupção de “banal” torna-se “habitual”, como advertiu Hannah Arendt.

Corremos o risco de termos, no futuro, um país desarmado, incapaz sequer de indignar-se. Fora da relação entre o corruptor e o corrupto, estará sempre um terceiro que sofre as consequências nefastas desta perversa convivência.

Trata-se do cidadão comum, que paga impostos, que, com o passar dos dias, se torna incrédulo e não sabe mais a quem recorrer, senão à proteção Divina.

Em face desse quadro inquietante, torna-se difícil acreditar num governo que se apresenta como novo, mas que desponta como obsoleto, contando com uma “comissão de frente” que é o seu ministério, bastante conhecido e já desmoralizado.