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A efetividade de ações judiciais contra alerta de blitz no Twitter

Artigo publicado na coluna “Direito sem Papel” no portal Consultor Jurídico

A Advocacia-Geral da União ingressou com uma ação judicial na última semana em Goiás para que as contas de Twitter que divulgam sobre blitz de trânsito sejam retiradas do ar. A AGU sustenta que o uso do Twitter para fazer os alertas viola artigos dos Códigos Penal e de Trânsito Brasileiro. Na eventualidade de o pedido ser aceito, pede que seja estabelecida uma multa diária de R$ 500 mil para quem descumpri-la.

No entanto, esta semana o MPF-GO manifestou-se contrário à decisão da AGU sob argumento de que “é absolutamente irracional, desde a pressuposição de convivência em sociedade aberta, constituída sobre os alicerces de liberdade, que se divise alguma possibilidade de se impedir o livro fluxo de informações pela internet”.

No início de janeiro de 2012, um juiz do Juizado Especial Criminal de Vitória concedeu uma liminar para que o Twitter bloqueasse o acesso a contas que avisavam da localização de blitz. O juiz classificou como atentado contra a segurança e serviço de utilidade pública, crime previsto no artigo 265 do Código Penal.

Qual a efetividade dessas ações judiciais?

A divulgação na internet do monitoramento da fiscalização do trânsito não é fato inédito quanto parece. Isto já vem ocorrendo há mais de ano pelo Twitter, sendo objeto inclusive de um bom aplicativo para iPhone que ajuda aos motoristas a se alertarem com diversas informações adicionais sobre o trânsito.

O que ocorreu desta vez foi um maior destaque de um fato surgido pela internet pela mídia nacional, sobretudo a televisiva.

Após a análise das peças da AGU e do MPF-GO concluo que é sempre uma temeridade arriscar comentários sobre o deslinde de um processo que ainda está no nascedouro, mas ainda assim é possível fazer algumas interpretações objetivas sobre probabilidades.

— A petição inicial da AGU a meu ver é inepta, pois alguns réus apenas foram referenciados por meio da indicação do endereço de suas respectivas contas do Twitter que vem divulgando informações sobre blitz. Inexiste qualquer dado adicional sobre os mesmos. Conforme o artigo 282, inciso II, desse Códex, o autor tem o ônus de indicar os nomes, prenomes, estado civil, profissão, domicílio e residência do autor e do réu. Uma vez descumprido este requisito, ensejará indeferimento da inicial com a extinção do processo, sem resolução de mérito, consoante os artigos 267, inciso I, e 295, inciso I, do CPC.

— Mesmo que na remota hipótese for aceita apenas a referência ao endereço das referidas contas do Twitter, a dificuldade de efetivar a citação destes réus será ainda maior, porque o pedido da AGU para que o Twitter revele os dados que possui sobre o perfil dos titulares das contas, tem efeito prático duvidoso. O cadastro destes usuários, além de eventualmente conter dados falsos, não deverá ser aceito, pois, em casos análogos, já ficou demonstrado que a empresa norte-americana não se vê obrigada a cumprir medida judicial oriunda da jurisdição brasileira.

— Isto porque, pelo que se sabe, inexiste escritório de sucursal do Twitter no Brasil, cuja sede está localizada em São Francisco, EUA, sujeito a jurisdição californiana, ou mesmo representante legal com poderes de receber citação.

— Portanto, mesmo que superada a hipótese inarredável de inépcia, a efetividade do cumprimento de uma eventual liminar concedida para revelar dados dos titulares das contas ou o bloqueio das referidas contas, só aconteceria se o Twitter por vontade própria deliberasse em colaborar com a Justiça brasileira para tomar tais atitudes, inexistindo precedentes neste sentido.

Além disso, não me convenço que os artigos referenciados pela AGU sejam efetivamente violações praticadas pelos réus nestes casos concretos. Até porque não se admite elasticidade ou intepretação analógica dos tipos criminais na esfera penal.

Segundo a Advocacia Geral da União, encontram-se violados os seguintes artigos:

265 do Código Penal (atentado contra a segurança de serviço de utilidade pública);

348 do Código Penal (favorecimento pessoal) do Código Penal;

165 do Código Nacional de Trânsito (dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência);

Art. 210 do Código Nacional de Trânsito (transpor, sem autorização, bloqueio viário policial);

Art. 230 do Código Nacional de Trânsito

Conduzir o veículo:

I — com o lacre, a inscrição do chassi, o selo, a placa ou qualquer outro elemento de identificação do veículo violado ou falsificado;

II — transportando passageiros em compartimento de carga, salvo por motivo de força maior, com permissão da autoridade competente e na forma estabelecida pelo Contran;

III — com dispositivo anti-radar;

IV — sem qualquer uma das placas de identificação;

V — que não esteja registrado e devidamente licenciado;

VI — com qualquer uma das placas de identificação sem condições de legibilidade e visibilidade.

306 do Código Nacional de Trânsito (conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência)

310 do Código Nacional de Trânsito (permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou, ainda, a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança).

Não vejo como aferir ilicitude a partir da interatividade da troca de informações pela internet como causa inequívoca das supostas violações.

Não se trata apenas de uma defesa de liberdade de expressão na internet, mas sim da inaplicabilidade de dispositivos legais para punir os infratores. Sempre que me deparo com situações inéditas geradas a partir do meio eletrônico que resultam em conflitos jurídicos, tenho o hábito de tentar analisar, por analogia tais fatos, como se as condutas praticadas no mundo presencial.

Se refletirmos sobre o fato, concluiremos que a atitude do cidadão em dar publicidade a terceiros sobre a existência de blitz de trânsito é algo corriqueiro e nunca gerou qualquer punição. Afinal de contas, você conhece algum caso em que um motorista tenha sido condenado por ter piscado o farol para terceiros que vem no sentido oposto na estrada alertando sobre a existência de uma blitz?

No meu ponto de vista, a automação via Twitter potencializou a maneira como o cidadão alertava sobre a existência da blitz, não mais se restringindo apenas aqueles que vinham no sentido oposto, mas sim a enorme comunidade que o segue pela internet. Isto nunca foi considerado crime. A reflexão correta a meu ver é: twittar sobre blitz de trânsito é de fato um problema ou uma solução?

ALEXANDRE Rodrigues ATHENIENSE

Advogado especialista em Direito de Tecnologia da Informação

alexandre@atheniense.com.br | @atheniense

www.alexandreatheniense.com | www.dnt.adv.br

 

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