Ações judiciais contra operadoras de convênios médicos se multiplicam

Há 15 dias, quando a pequena Maria Clara, de apenas 6 anos, foi hospitalizada com encefalite, o pai, o corretor de imóveis Ronaldo José de Oliveira, 46 anos, achou que não teria problemas com o atendimento. Ao chegar ao hospital, no entanto, descobriu que o plano de saúde que havia sido vendido a ele não estava sequer implantado. A menina precisou de poucos dias na Unidade de Terapia Intensa (UTI), mas, sem o convênio, a conta chegou a R$ 35 mil. Sem ter como pagar, Ronaldo se virou como pôde: vendeu o carro e recorreu a um familiar para inteirar o restante da conta.

“Fizemos o plano em agosto, por meio de uma administradora, e ele deveria estar normalizado a partir de outubro. Só agora descobri que faltavam documentos para o fechamento do contrato, e até um diploma universitário falso, em nome da minha esposa, havia sido anexado”, reclama. Ele recorreu à operadora, tentou resolver o caso amigavelmente, mas não obteve resposta. Agora, ajeita os papéis para dar entrada em um processo na Justiça. “O prejuízo maior não é o financeiro, é o psicológico”, completa.

Presença constante no banco dos réus, as operadoras de plano de saúde são constantemente condenadas por desrespeitos ao consumidor. Os motivos, geralmente ligados a negativa de cobertura ou desrespeito ao contrato, evidenciam a necessidade de uma legislação mais clara e uma regulação mais rígida, com punições adequadas.

Atualmente, faltam números. Nem o Superior Tribunal de Justiça (STJ), nem o Supremo Tribunal Federal (STF), muito menos os órgãos estaduais têm noção da quantidade de demandas sobre o assunto. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e as federações e associações do setor tampouco. Só de acórdãos que geraram jurisprudência – quando uma decisão, após ser tomadas repetidas vezes, se torna um entendimento sobre o tema – o STJ tem 1.245, além de duas súmulas.

Os abusos são tantos que uma recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de 2010, orienta os tribunais a adotarem medidas, como seminários instrutivos sobre o tema saúde, “visando melhor subsidiar os magistrados e demais operadores do direito para assegurar maior eficiência na solução de demandas judiciais”.

“Os procedimentos oferecidos se diversificaram, e, com eles, as negativas das operadoras – o que elas puderem recusar, vão recusar. O problema é que muitas vezes o consumidor fica inerte, não questiona ou procura seus direitos”, explicou o advogado especialista em Direito à Saúde, André Schleich. “Procedimentos médicos em geral são onerosos, e os planos de saúde cobram muito caro por isso. O direito à saúde de alguém nunca deve ficar atrás dos direitos de uma operadora. A análise tem ser benéfica ao consumidor.”

 

Campeão de reclamações 

Antes de invadirem os tribunais, os planos de saúde já reinam nos rankings de órgãos de defesa do consumidor. Segundo o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) o setor de saúde suplementar é o mais reclamado há 12 anos. “Os casos mais comuns são rescisão ou alteração de contrato, negativa de cobertura, reajuste e descredenciamento de rede”, enumera o gerente técnico do Idec, Carlos Thadeu de Oliveira. “A ANS deveria ter um método mais rigoroso para autorizar as empresas a operarem. Se existe um produto que apresenta muitos problemas, quem está licenciando aquilo está errando. O paralelo vale para a saúde”, completa.

Ele afirma que muitas dessas empresas, mesmo estando entre as mais reclamadas, seguem adquirindo carteiras de beneficiários de outras operadoras que vão falindo. A situação alastra o problema do mau atendimento e do desrespeito.

Cláudia Chizzolini, de 45 anos, por exemplo, teve um susto quando viu o aumento de 156% na mensalidade de julho. Ela atua como gerente de recursos humanos de uma administradora de condomínios e, desde 1992, a empresa em que trabalha oferece o plano a 160 funcionários e dependentes. Diante do aumento, Cláudia e os colegas não pensaram duas vezes: levaram o caso à Justiça. “O tempo vai passando e o público vai envelhecendo. O plano de saúde afirmou que o aumento era devido à sinistralidade, mas nenhum dado que comprovasse isso foi apresentado”, conta.

Ela procurou a ajuda de advogados e, em uma semana, o processo foi concluído a favor dos funcionários. “Ficamos encurralados e tivemos que gastar R$ 30 mil com honorários, mas dividimos esse valor entre os colegas. No fim das contas, o aumento no plano foi de apenas 18%.” Os convênios coletivos não possuem reajustes regulados pela ANS. A justificativa do órgão regulador é que, como os empregadores têm contratos que envolvem muitas vidas, possuem poder de barganha e conseguem negociar descontos. Mesmo assim, quando a correção é considerada abusiva, o usuário pode — e deve — recorrer a um órgão de defesa do consumidor ou à Justiça.

Fonte: Estado de Minas

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