Nos últimos anos, já convivemos com a possibilidade de adquirir tarifas promocionais, com preços baixos,
vinculados a determinados dias, horários de voos e com inúmeras restrições contratuais vinculadas – por
exemplo, a negativa de alteração da data de embarque ou desembarque. A proposta da Anac pode, de fato, beneficiar o passageiro que realiza uma viagem rápida, já que aumenta o peso da mala de mão de 5kg para 10kg.
Entretanto, nossa preocupação se direciona ao passageiro que planeja despachar sua mala e com a possibilidade de ficar mais tempo no local desejado. Nesse caso, devemos
ter cuidado ao analisarmos duas situações distintas: voos domésticos (nacionais) e internacionais.
Voos domésticos
Em viagens dentro do Brasil, entendemos como abusiva a proposta que visa extinguir a franquia de 23kg. Fazemos as seguintes indagações: qual será, de fato, o benefício para o consumidor? O valor cobrado pela mala despachada pode ser superior ao da tarifa reduzida?
Defendemos a manutenção da franquia da mala nos 23kg por pessoa, conforme já vigente em nosso país. O acesso ao transporte não se restringe apenas ao passageiro que realiza viagens rápidas e utiliza apenas a mala de mão, mas também aos demais passageiros que necessitam realizar viagens longas, seja a trabalho ou lazer, que transportam seus pertences pessoais em malas com até 23kg.
Voos internacionais
A redução gradual da franquia de bagagem para voo internacional será um abuso aos direitos dos
passageiros-consumidores. Não concordamos com a singela justificativa da agência reguladora de que tais restrições buscam “alinhamento das regras de franquia” de bagagem despachada com o resto do mundo (desregularização).
De acordo com dados divulgados pela OMT (Organização Mundial do Turismo), os brasileiros, quando
viajam ao exterior, têm como principais destinos os Estados Unidos, a Argentina, a França e Portugal.
Esses países, exceto Argentina, estão localizados em outros continentes que demandam viagens aéreas
longas, com maior tempo de permanência no exterior e a necessidade de utilizar, em algumas estações do ano (inverno e outono), vestuários “pesados”, que acarretam maior volume na mala transportada.
Não se pode admitir como necessária a redução da franquia de 64kg (duas malas de 32kg) para 46kg (duas malas de 23kg), depois para 23kg e, após dois anos de vigência da nova regra, apenas a franquia de
10kg na mala de mão. Novamente, indagamos: qual será a redução dos preços para o passageiro? Qual o
valor dos quilos cobrados por mala após a eliminação da franquia da bagagem despachada?
Cabe reiterar que não merece respaldo justificar que a eliminação da franquia da bagagem, amparada
na “bandeira da desregulamentação”, deverá proporcionar maior concorrência e o surgimento de novos
modelos e oportunidades de negócios. Ora! Tais justificativas contrapõem-se aos direitos do consumidor-passageiro e demonstram-se equivocadas, já que o elevado custo do setor aéreo não está vinculado ao peso das malas dos passageiros, mas, sobretudo, à intervenção do governo na economia, ao excesso da carga tributária e à falta de concorrência, de segurança jurídica, de fiscalização, entre outros.
O estudo superficial fornecido pela Anac, que defende a vigência do art. 14 (fls. 46/62), não consegue
sequer amparar suas propostas com gráficos oficiais que demonstram, de forma inequívoca, que a necessidade de eliminar a franquia das malas nos transportes aéreos, nacionais e internacionais, garantirá a redução real dos preços das passagens ao consumidor. Pelo contrário, são apenas meras suposições que não atendem, de fato, à realidade nacional.
O mencionado relatório da Anac apenas dispõe-se a amparar a supressão desse serviço ao exemplificar a
empresa aérea Air France (f. 58), que apresenta uma realidade completamente diversa do Brasil, seja pela sua localização geográfica, dimensão territorial ou pela situação econômica da empresa e do país onde possui sede. A suposta euforia de estimular empresas low cost no Brasil deve ser repelida. Os consumidores brasileiros já conviveram com exemplos de outras companhias aéreas que iniciaram sua atuação no mercado com esse objetivo, preços baixos (Gol e WebJet), que não conseguiram manter essa proposta, em virtude do excesso de carga tributária, da instabilidade econômica.
Portanto, torna-se descabido e, principalmente, contrário à legislação consumerista e à realidade do
nosso país aderir aos arts. 14 e 60 propostos pela Anac, que sugere, de forma equivocada, o direito da empresa de transporte aéreo de determinar, de forma opcional, o transporte da mala dos passageiros e a possível cobrança deste serviço, denominado como adicional.
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