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Democracia relativa e corrupção absoluta

Nos votos proferidos no Supremo Tribunal Federal, na Ação Penal 470, a corrupção constituiu elemento marcante e comum a todos os réus.

Ainda que os métodos postos em prática sejam diferentes, há entre eles um dado comum usual, que envolve a participação de dois atores: um que, pela posição que desfruta, ofereceu algo valioso; e outro, disposto a aceitar a oferta, fornecendo em troca elementos de interesse do proponente.

A corrupção é uma prática social disseminada em todas as atividades. A sua característica consiste no fato de que o depositário da confiança, implícita ou explicitamente, abusou das regras do jogo celebrado com quem lhe outorgou esta segurança.

O termo “corrupto” aplica-se a quem instiga ou aceita a fraude, atuando ativa ou passivamente.

Na China, onde a corrupção é castigada com pena de morte, registram-se graves casos de corrupção dentro do próprio governo, inobstante o poder de investigação ilimitado que a cúpula do partido conserva.

A corrupção apurada na Ação Penal 470 vem sendo avaliada em relação à individualidade. Há quem sustente a inexistência de corrupção política, propriamente, pois o que temos não é mais que a deterioração de indivíduos que são políticos.

Maquiavel, no seu tempo, sustentara que o mundo político possui regras próprias e deve ser avaliado conforme essas mesmas regras e não sob critérios da moral particular.

A história demonstra que ocorre a mudança do regime politico sempre que o grau de devassidão alcança índices inadmissíveis. Sobrevém, então, a deposição do regime tido como nocivo e a constituição de um novo, interessado em reordenar o país e instaurar o bom convívio social.

Platão sustentou que a existência de um ciclo de transformações políticas é movido pela corrupção que se instala em todos os governos. A princípio, havia uma cidade que se converteu em monarquia. Mas, como essa desviou-se de seu fim e o monarca agia voltado sempre para o seu interesse, a monarquia converteu-se em tirania.

É em razão da corrupção que os regimes se degeneram, concorrendo para que o povo promova a deposição de quem esteja no poder, levado pela esperança de que o novo dirigente será melhor que o anterior.

Para Rousseau, os homens são bons por natureza, mas se corrompem pela vida em sociedade.

Diante do que vem ocorrendo no STF, vale a renovação de alguns conceitos. Segundo o humorista Jô Soares (1995), “a corrupção não é uma invenção brasileira, mas a impunidade é coisa muito nossa”.

Paulo Brossard (1978), ex-ministro da Justiça e do STF, além de comungar daquele entendimento, acrescentou: “A democracia neste país é relativa, mas a corrupção é absoluta”.

Diante dessas reflexões e considerando o que já foi apurado no rumoroso julgamento do mensalão, torna-se atual a observação de Machado de Assis, no século passado, de que “a ocasião faz o furto, pois o ladrão já nasce feito”.

Verdade atual que não deve surpreender.

 

Atheniense

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