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Quem ficará preso?

Por Aristoteles Atheniense

A recente decisão da Segunda Turma do STF, concedendo direito à prisão domiciliar a nove executivos envolvidos na Operação Lava Jato, mediante condições específicas, provocou reflexões tanto em relação ao seu resultado, quanto à sua oportunidade.

O habeas corpus foi impetrado em favor de Ricardo Pessoa, presidente da UTC, sócio de Alberto Youssef e coordenador de um “clube” de empreiteiras para fraudar licitações da Petrobras.

O relator, ministro Teori Zavascki, deferiu a ordem, estendendo-a a outros oito empresários. A seu ver, a prisão preventiva não é “o momento de formular juízos condenatórios”. Caso mantida, haveria condenação antecipada, “sem que o acusado tivesse chance de se defender”, não havendo nos autos indícios reais de que o paciente (acusado) pudesse fugir do país ou interferir nas investigações.

Votaram com o relator os ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Este último, paradoxalmente, mesmo admitindo que o Brasil esteja “disputando e ganhando campeonatos mundiais de corrupção”, deferiu a liberação carcerária.

A prisão preventiva, que pode ser decretada em qualquer fase do inquérito, é concedida por conveniência da instrução criminal ou se houver razões sérias e objetivas para sua decretação, diante da gravidade do delito e da repercussão que tiver na sociedade (arts. 312/315 do CPP).

Quanto à prisão domiciliar, prevista na Lei de Execuções Penais (Lei 7.210/84), o seu artigo 117 contém hipóteses exaustivas, não comportando outras interpretações abrangentes que abarquem situações não contempladas em seu texto.

Em voto contrário à concessão do habeas corpus, a ministra Carmen Lúcia ressaltou que Ricardo Pessoa prestará depoimento na próxima segunda-feira, 4, opondo-se ao relator que sustentou já estar quase concluída a investigação.

Segundo ela, “o quase não é o fim. Testemunhas ainda podem ser reinquiridas. Como não existe mulher quase grávida, não existe instrução quase acabada”. No mesmo sentido, votou o ministro Celso de Mello, reputando que “as circunstâncias que justificaram a prisão cautelar do paciente ainda não se exauriram”.

O voto vencedor, ao conferir exegese ampla ao mencionado artigo 117, beneficiando os demais encarcerados, instituiu obrigações que, entre outras, deverão cumprir: o afastamento das empresas onde trabalham, bem como a proibição de contato com outros investigados.

Assim, deixou de indicar como seria apurada a observância desses requisitos e se a sua desobediência importaria na imediata revogação do regime domiciliar de que irão desfrutar.

A experiência vem demonstrando que as restrições da Lei de Execução Penal nem sempre são atendidas. O ex-ministro José Dirceu, em prisão domiciliar desde novembro do ano passado, continua exercendo atividade de assessor, como já fazia antes, para as empresas OAS, Engevix, Camargo Corrêa, todas envolvidas no escândalo da Petrobras, o que já lhe assegurou um rendimento superior a R$8 bilhões.

A liberação de Ricardo Pessoa era considerada a mais importante, diante de seu anunciado propósito em revelar fatos comprometedores que atingiriam Dilma Rousseff, além de alguns ministros e sua base aliada.

Na concepção do relator, as provas dos crimes cometidos, por mais graves que sejam, não legitimam o decreto de prisão preventiva. Em face dessa assertiva, o esforço expendido pelo juiz Sérgio Moro, até agora, desabou. O magistrado ficou sem condições de determinar novas prisões preventivas, diante do entendimento majoritário da segunda turma do STF, que tem competência preventa para o julgamento final.

A colocação de tornozeleiras eletrônicas e a entrega de passaportes não são medidas suficientes para respaldar a decisão questionada. A possibilidade de Ricardo Pessoa e seus assemelhados serem condenados, mesmo diante das exuberantes provas já coletadas, a partir de agora tornou-se remota.

Quanto ao combate à impunidade, que Dilma Rousseff adotou como sendo o seu “carro-chefe”, ganhou força junto aos seus sectários, embora se trate de uma simulação amparada no critério agora sufragado pelo STF. E do que já foi decidido, não cabe recurso.

Quem ficará preso, afinal?

Atheniense

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