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O discutido foro privilegiado

Após longa expectativa, o Supremo Tribunal Federal alterou a interpretação relativa ao foro por prerrogativa de função, assentando limitações não previstas na Constituição ao “emendar” o seu artigo 102. Doravante, o “foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas”.

Se a nossa Lei Maior prescreve que “todos são iguais perante a Lei”, o ideal seria a eliminação desse tratamento diferenciado em qualquer nível dos três poderes. A finalidade precípua do foro privilegiado não seria de proteger determinadas pessoas, mas, sim, os cargos que estejam exercendo.

Na votação ocorrida no STF, por 7 votos a 4, os seus ministros decidiram que deputados federais e senadores só têm esse direito excepcional quando os crimes, por que respondem, foram cometidos no exercício do mandato em função do cargo que ocupam. Assim, crimes comuns praticados antes de os parlamentares assumirem os seus cargos, ou sem nenhuma ligação com a atividade exercida, serão julgados por Tribunais de primeira instância.

Uma das dúvidas surgidas, devido à inexistência de uma regra específica, é saber como ficará o foro dos parlamentares que se reelegeram e respondem por crimes cometidos no mandato anterior. Ao que tudo indica, caberá a cada ministro decidir no processo de que é relator se o crime foi cometido – ou não – em função do cargo em que está investido.

No Brasil, segundo a Consultoria Legislativa do Senado, há mais de 38 mil autoridades acobertadas pela exceção contida na Lei Maior, em vigor.

A justificativa que propiciou a criação de foros privilegiados para políticos decorreria da necessidade de impedir que os julgamentos fossem influenciados por tensões e disputas de poder nas regiões em que são votados.

O povo, mesmo sem entender bem o que ficou assentado na mais alta Corte, reputou como sendo um bom começo a restrição do foro privilegiado para deputados federais e senadores. A Câmara Alta, no primeiro semestre de 2017, aprovou as alterações sugeridas pelo STF, o mesmo acontecendo na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados.

Em dezembro passado, o presidente Rodrigo Maia criou uma comissão especial para apreciar o tema controvertido. Este órgão ainda não funciona pelo fato de que nem todos os partidos indicaram seus representantes, segundo alegou o seu relator Efraim Filho (DEM-PB).

Enquanto não forem desfeitas essas dúvidas, teremos discordâncias entre a Comissão Especial da Câmara e o entendimento do STF. Vale, no entanto, reconhecer que a palavra final será dada pelo Judiciário, inobstante o desgaste que esse Poder vem sofrendo junto à opinião pública.

Prevaleceria, neste caso, o adágio: “judex est lex loquens” (“a lei fala pela boca do juiz”) ou “jus facit judex”, isto é, “o juiz faz o direito”.

Em outras palavras: o Supremo Tribunal Federal nunca erra (“tollitur quaestio”).

Assunto encerrado, não se fala mais nisso.

Aristoteles Atheniense

Presidente da Seccional mineira da OAB por dois períodos (1979 a 1983); Secretário Geral do Conselho Federal (1993/1995); Vice-Presidente Nacional da OAB

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