Artigos

Ceder assento mediante compensação financeira é opção do passageiro, não obrigação

Por Luciana Atheniense

Nesta semana foi veiculada nas redes sociais uma cena revoltante em que um passageiro é obrigado a ceder seu assento, à força, para outro que era funcionário da empresa aérea e também desejava viajar para este mesmo trecho.

O episódio ocorreu num avião da United Airlines no trajeto Chicago/Louisville, que estava lotado. Nenhum passageiro se dispôs a ceder seu assento, mesmo após inúmeras ofertas disponibilizadas pela empresa.

Diante desta “resistência”, o piloto resolveu fazer um sorteio como forma de obrigar alguém a “ceder” o assento. Tal fato causou indignação não apenas ao “sorteado”, que foi retirado da aeronave arrastado por policiais, como também às demais pessoas que presenciaram ao incidente constrangedor.

No Brasil, a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), em sua Resolução 400/2016, determinou que, havendo preterição, que consiste na negativa de embarque do passageiro que compareceu pontualmente para o voo, poderá ser incluída a situação de “overbooking” , ou seja, , excesso de venda de bilhetes em relação à capacidade da aeronave. (arts. 23 e 24).

Neste caso, a empresa deverá procurar voluntários para embarcar em outro voo, mediante compensações negociadas entre ela e o passageiro. Caso ocorra um acordo entre as partes, o passageiro deverá assinar um recibo, comprovando que aceitou, por vontade própria, a proposta que lhe foi formulada (art. 23, § 2º). Esta situação deverá ser benéfica às duas partes, ou seja, amparada pela liberalidade do passageiro em querer aceitar a proposta formulada pela companhia aérea.

Se a empresa não conseguir encontrar voluntários, o passageiro que vier a ser preterido deve ter o direito de optar por: reacomodação em outro voo, reembolso integral ou a prestação do serviço por outra modalidade de transporte (art. 21). A empresa terá, também, a obrigação de fornecer assistência material (comunicação, alimentação e hotel), quando cabível (art. 27).

Embora a ANAC obrigue a empresa a fornecer meios para transportar o passageiro ou até mesmo restituir o valor pago pela passagem não utilizada, não se ateve à necessidade de conceder ao consumidor a reparação pelos danos morais. É notória a frustração e o desgosto do passageiro quando não consegue utilizar a passagem aérea conforme almejava.

Esta omissão por parte da agência reguladora contraria o Código de Defesa do Consumidor Aéreo, que define como um dos direitos básicos a “efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais” (art. 6, VI).

De forma arbitrária ao disposto em nossa legislação e nas decisões judiciais sobre o tema, a ANAC tenta definir a limitação da compensação financeira ao passageiro, que poderá ser por transferência bancária, voucher ou em espécie (art. 24), no valor de 250 DES no caso de voos domésticos (R$1.063,97) e 500 DES para voos internacionais (R$2.127,95). Esses valores, que são vinculados aos Direitos Especiais de Saque (DES), foram definidos de acordo com a unidade monetária utilizada internacionalmente na aviação.

Ora, os limites estabelecidos pela ANAC demonstram o seu menoscabo em relação aos direitos dos consumidores, que são regidos pela legislação consumerista e amparada por decisões de nosso Poder Judiciário.

Diante destas ponderações, esclareço que tanto em território norte-americano como brasileiro, as empresas aéreas devem ter bom senso, zelo e, sobretudo, respeito aos passageiros, pois, são eles que sustentam sua atividade comercial.

Atheniense

Recent Posts

Cancelamento inesperado do voo TAP Confins–Lisboa gera atrasos e transtorno

CDC garante assistência, reacomodação sem custo e indenização ao passageiro prejudicado. Leia o artigo completo…

1 mês ago

STF pode enfraquecer direito do consumidor em ações sobre viagens aéreas

Tema 1417 avalia prevalência do CBA sobre o CDC e ameaça reduzir direitos de passageiros,…

1 mês ago

Balonismo turístico cresce no Brasil sem regras, controle ou segurança

Em sua coluna no jornal Estado de Minas, a advogada Luciana Atheniense, especialista em Direitos…

4 meses ago

Luciana Atheniense concede entrevista sobre desrespeito aos consumidores na Vesperata de Diamantina

A advogada Luciana Atheninese concedeu entrevista ao Jornal Estado e Minas em matéria que denuncia…

5 meses ago

Luciana Atheniense concede entrevista à Rede Globo

Confira trecho da entrevista da advogada Luciana Atheniense, ao jornal MGTV, em matéria sobre direitos…

6 meses ago

Cancelamentos de hospedagens para o show da Lady Gaga no Rio de Janeiro

Leia abaixo a íntegra da coluna da advogada Luciana Atheniense no jornal Estado de Minas…

6 meses ago