Categories: Artigos

O estímulo à corrupção

Por Aristoteles Atheniense

Urge ser avaliada, tanto pelos seus efeitos jurídicos como éticos, a Medida Provisória 703, que se encontra em vigência desde 18 de dezembro de 2015.

Foi mais um artifício do governo petista com a finalidade de exaurir a Operação Lava Jato, desestimulando a atuação do Ministério Público na ação empreendida contra as empreiteiras que saquearam a Petrobras, amenizando os efeitos punitivos a que seus dirigentes estão sujeitos.

Há muito, Dilma revelou sua condescendência com a devassidão que assola o País. Em seus pronunciamentos no exterior, fez-se passar por uma permanente sentinela dos cofres públicos, inclemente em castigar os infratores, ainda que integrantes de sua grei.

Pela malsinada MP 703 foi permitida a manutenção das empresas sindicadas para prosseguirem nas obras superfaturadas de que se locupletarem, favorecendo o partido que as contemplou nas licitações fajutas de que participaram.

O novo diploma permite, ainda, que as mesmas construtoras, cujos donos “estagiam” na Papuda e em Curitiba, possam obter novas concessões em todos os níveis da administração: federal, estadual e municipal.

Para que sejam obsequiadas por essas vergonhosas benesses é suficiente que celebrem “acordos de leniência”, que lhes assegurarão novas negociações com o governo, como se os inquéritos ainda em curso não passassem de mera ficção.

Os professores italianos Barbieri e Giavazzi, em obra que se aplica ao caso vertente (“Corruzione a norma di legge”, Rizzoli, 2014), foram precisos ao advertir: “A corrupção mais grave, ou seja, a que mais causa danos à sociedade, não é aquela que decorre da violação das leis, mas sim a que se encontra na corrupção das próprias leis. São as leis – elas próprias – que são corrompidas, ou seja, escritas e aprovadas a favor dos corruptos contra os interesses do Estado. em face desse tipo de corrupção, a Justiça fica desarmada, razão pela qual somente pode ela ser combatida pela política e pela cidadania”.

Como no Brasil de hoje não podemos contar com os políticos, que institucionalizaram a propina que os alimenta, só restará o clamor público nas ruas, denunciando mais esse expediente de um governo desacreditado.

Embora entidades representativas do Ministério Público hajam encaminhado ao procurador-geral da República (quatro dias após a publicação da indigitada MP) incisivo pedido para que ingressasse logo com ação direta de inconstitucionalidade (Adin) contra a obscena iniciativa, até hoje não há notícia de que essa reclamação surtiu resultado.

Como assinalou Modesto Carvalhosa, jurista consagrado e autor de obras contra a corrupção, enquanto a famigerada MP estiver em vigor, subsistirá o risco de um conchavo entre a CGU e a empresa investigada, através de acordo de leniência, “para que cessem quaisquer medidas judiciais contra ela já propostas pelo Ministério Público Federal”.

Cumpre, portanto, a Rodrigo Janot, no exercício de sua elevada função, abonar a atuação de seus subordinados. Cabe-lhe impedir que as empresas transgressoras sejam estimuladas a promover ou a restabelecer contratos com o Poder Público que não foram capazes de honrar.

A abominável omissão, mesmo se amparada em lei, reveste-se de extrema gravidade que não pode ser tolerada.

 

Atheniense

Recent Posts

Jornal Estado de Minas publica artigo de Luciana Atheniense sobre transporte aéreo de animais de estimação

Morte de cão em voo da Gol: as falhas no serviço e os direitos do tutor…

2 semanas ago

Direitos dos passageiros x cancelamento da COPA – Boeing 737 MAX 9

Por Luciana Atheniense A COPA Air Airlines, atendendo à determinação da Agência Nacional de Aviação…

4 meses ago

Ainda posso alugar imóvel no fim de ano pelo Airbnb?

Por Lilian Muschioni Recentemente o STJ publicou acórdão sobre caso julgado em 2021, mantendo a…

5 meses ago

Ainda posso alugar imóvel no fim de ano pelo Airbnb?

Por Lilian Muschioni Recentemente o STJ publicou acórdão sobre caso julgado em 2021, mantendo a…

5 meses ago

STF valida regra sobre banco leiloar imóvel com dívidas sem passar pelo Judiciário

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) validou a lei 9514 de 1997 - em…

5 meses ago

Desistência anterior à citação do réu isenta o autor de complementar pagamento de custas

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, entendeu que não é…

7 meses ago